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A Inesperada compra do Colibri

Miguel Genta, meu amigo do peito, havia construído o seu primeiro Fiesta e levou muito tempo para ir para água. Quando ficou pronto enfrentou dois problemas: o primeiro é que haviam mudado as regras de regata e o barco passou a medir mal; o segundo foi na estrutura, pois para fazer ele bem leve, ficou fraco, sendo que logo na primeira navegada já fez água pela quilha. Também, colocaram os parafusos da quilha todos alinhados, fazendo esforço só no centro, ainda, mais que e a parte interna estava sem reforço. Aí foi mais uma obra, refizeram muito bem feito, mas o barco ficou pesado e não teve sucesso. Com isso, foi abandonado para as regatas. Ficou um tempão em seco, no Veleiros do Sul, até que eu fui a Buenos Aires e conheci, na época, o Colibri 24', do Nestor. Miguel tinha vontade de importar um, mas era muito dispendioso e resolveu comprar um Delta 26', ainda com poucas unidades navegando, sendo que o dele foi o primeiro construído para regatas. Eu sonhava acordado com o antigo Fiesta, pois assisti a sua construção aqui em Rio Grande, mas não me animava a falar com o Miguel.

Um dia, eu estava navegando no São Gonçalo, quando meu motorzinho Jonhson 1957 (do tempo do motor a carvão), me incomodou. Na segunda-feira, de volta em casa, liguei para o Miguel e pedi que ele desse uma olhada em algum motor de 10 HP que tivesse bom, pois o meu iria pegar uma aposentadoria por tempo de serviço. Ele me perguntou: “- porque ao invés de comprar um motor tu não compras o Fiesta?” Fiquei engasgado e não consegui nem responder na hora. Então ele disse: “- Vende o teu barco e me dá de entrada, e vai pagando como puderes.” Ele havia tirado o mastro, a retranca, o pau de spinaker, a quilha e ferragens, deixou uma vela mestra que era do Solitaire, o outro barco que tinha, e, uma genoa II, que, por coincidência, foi do Vagabundo. Comprei, na realidade, o casco, o leme, o motor que estava nele e as velas. Só que o mastro, a retranca e o pau de spinaker não serviram, porque eram grandes para o barco. Então ele disse: “- vem buscar o barco, que está parado, e depois vende o teu.” Eu fiquei nas nuvens e me larguei com meu primo Vilmar dos Santos, também velejador, e dos bons! O Miguel mandou entarugar os parafusos da quilha e colocar o barco n'água para que eu não perdesse tempo.

Saímos de Rio Grande numa quinta-feira a tardinha e fomos para a casa do Miguel. Na sexta-feira fomos para o clube, colocamos água e combustível. O motor era um Mold, de 14 HP, a dois tempos, fabricado em Joinville-SC. Eu, como mecânico, me dava muito bem com ele. Ligamos para uns amigos e conseguimos reboque de uma chata da Navegação Taquara, ela tinha duas rabetas na popa, era uma barulheira infernal. Tudo bem! O negócio era chegar em Rio Grande. Sem quilha, sem mastro, só com o leme. Combinamos que, por volta das 22:00 horas eles passariam em frente ao Veleiros do Sul e eu chamaria pelo VHF portátil, emprestado do Miguel, para acertar as manobras. Dito e feito! As 22:30 horas eles apareceram e chamei pelo VHF. Eles atenderam e disseram: “- tiraremos a máquina e tu encosta na popa.” Tinha um vento sudoeste forte, com ondas no Guaíba. Entrei na popa da chata e me atiraram um cabo que dava para amarrar um cargueiro, por sorte eu havia colocado um amarrador na proa com uma super estrutura por baixo, o qual está até hoje agüentando o tranco. Colocamos um pneu entre a chata e nós e vários pontos de reforço nos molinetes, pontos de escota e outros. Todos puxando juntos. Começou a puxar, pendulava bastante. Por sorte naquela época usavam um motor de cada vez para economizar os rolamentos das rabetas, pois eram caros. Revezavam os motores e quem ganhou com isso foi o meu barco, que andava a quatro nós sem dar tranco. Só o que incomodava era o turbilhão da rabeta quando virava para o nosso lado, amarramos o leme “a meio” e fomos curtir o barco, examinando tudo por dentro. O primo fez boas comidas. É um bom cozinheiro!

Passamos pelo farol de Itapuã durante a madrugada e entramos na Lagoa dos Patos. O vento acalmou, estaria uma beleza se não fosse o barulho do motor da chata. Mas, quando estávamos em frente ao farol do Cristóvão Pereira, a chata parou e fundeou. Fiquei observando o movimento e, de repente, o cozinheiro saiu para a popa e lançou uma linha na água para pescar. Pensei: “- estamos ferrados!”, logo em seguida aparece o comandante e diz que vamos ficar parados por mais ou menos uma hora, pois um dos motores do leme parou de funcionar. Eram motores elétricos, um para cada lado. Falei: “- tudo bem, sem problemas!” Passou uma hora e nada. Saem então dois marinheiros, com uma bateria imensa de grande. Saíram do tapume do motor que estava fora de uso e colocaram no que estava funcionando. Deram partida no motor, puxaram a ancora e seguiram em marcha. E assim fomos.

Lá na altura da barra de Pelotas, o vento virou de sudeste, a água começou a encher e ai ficou mais devagar ainda. Sei que chegamos perto da bóia 1 do porto novo, agradecemos a carona, ligamos o motor e fomos embora.

Quando chegamos no clube estavam a nossa espera os familiares, com churrasco e tudo, só que depois de três dias levando fuligem e chuva por cima, estávamos com uma cor que não dá nem para descrever, sem falar do mau-cheiro que exalava pelo corpo. Tomamos banho e aí sim, fomos para o churrasco. Que beleza! Olhando o Colibri alí de pertinho.

Porquê o nome de Colibri? Em primeiro lugar, me apaixonei pelo Colibri 24' em Buenos Aires, que é igual ao nosso Delta 26', a diferença é que o leme é externo. Em segundo lugar, porque minha mulher é uruguaia e, em espanhol, Colibri significa Beija-flor, um pássaro muito delicado e de rara beleza. Com isso, conseguimos dar alma nova ao barco.

Agradeço à todos que de uma forma ou de outra contribuíram para que eu pudesse adquirir e trazer o Colibri para Rio Grande, principalmente o esforço e a garra da Mirella, que muito contribuiu para que o sonho se tornasse realidade.


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