Histórias de uma Família Velejadora
- Newton Ribeiro
- 7 de dez. de 2020
- 4 min de leitura
A saga marítima de nossa família vem de longo tempo. O meu bisavô já fazia transporte de mercadorias entre Rio Grande e São José do Norte no século passado. Transportavam gêneros alimentícios e traziam cebola e outras mercadorias da costa do Mendanho, também conhecida pelos pescadores por Retiro, Jacinto Inácio, Barra Grande (onde nasceu meu pai), Passinho, Capivaras, Ponta Rasa, Várzea, Barrancos, todos eles localizados as margens da Laguna dos Patos.
Meu pai, Romildo Santos, que sempre foi um mestre e grande amigo para mim, nasceu dentro de um barco a vela, usado pelo meu avô para o trasporte de produtos entre a região leste da lagoa dos Patos e Rio Grande, pois não deu tempo de chegar a Rio Grande. Com um brisão de Sul, meu avô fez o parto de meu pai a bordo, e isto que a cada virada de bordo tinham que passar os sacos de lastro, de 50 kg, de um lado para o outro. Pobre dos proeiros naquela época. Vejam só que família!
Temos um timão todo trabalhado em madeira, que está há 125 anos na família. Ele era das embarcações a vela, e o último a usar foi o veleiro de meu pai, o “Vagabundo”. Agora este timão encontra-se em poder da neta mais velha do meu pai, Marlene Guevara Santos.
Eu comecei a velejar com um ano e meio de idade, amarrado pela cintura com um cabo, pois já com esta idade queria água a qualquer custo. Tenho fotos em frente ao Mercado Público de Rio Grande entre os anos de 58 e 59 com meu pai velejando no “Ingá” seu primeiro barco, mais parecido com um veleiro, que tinha panos de algodão e media mais ou menos 5,5 metros de comprimento.

Em 1965 ele comprou o “Mariluci”, um barco de construção escamada, com a popa estreita e bastante rápido. O apelido do barco era "coca-cola" por causa das cores do casco. Ele chegou a ganhar algumas regatas ali no atual clube.
No início eu não participava das regatas por ser pequeno, a tripulação era Romildo, Edson Fernandes, Zé Maurano e “Teixeira” que mais tarde foi proeiro do Jorge Vidal; As vezes revezavam alguns tripulantes.
Em Iniciada a construção em 1966, em 1967 foi para a água o “Tahiti”, com 22 pés, com o casco todo envernizado e com velas de dacron, projetado por Estevan Plana Martins (Estevinho), um riograndino, também de família de construtores de barcos e canoas, e construído por meu pai. Participamos de quatro edições da regata Porto Alegre – Rio Grande. O Tahiti era o menor veleiro participante e chegamos na frente de muito “grandão”. Tinha gente que dizia que o Tahiti era barco de andar na volta do mercado. Minha mãe, incentivadora da vela, morreu com essa mágoa de um amigo de infância.

Em 1977 foi para a água o “Vagabundo” veleiro de 35 pés, moldado a frio, projetado também por Estevan e construído pelo meu pai, o Tahiti havia sido vendido para investir na sua construção..

Eu, com doze anos em 1970 ganhei meu primeiro barco, um “supersnipe” com o nome de “Waikiki”. Naveguei pela Laguna dos Patos e andei por todos os seus recantos, mas os passeios que gostava mesmo era pela orla de São Lourenço do Sul, principalmente no Encontro da Vela, ocasião em que grande quantidade de velejadores do Estado, e até mesmo de fora do país, se encontravam durante o feriado de carnaval para realizar regatas e se divertir às margens do arroio São Lourenço quando ainda era na prainha, em frente ao atual iate clube.
O Jorge Vidal tirou uma foto do Tahiti nesta praia e o barco que esta a frente junto ao Tahiti é o meu, estou na foto no livro dele. Depois tive um Ligthning com o nome de Mercur.
Em 1982, uma semana após o falecimento de meu pai, comprei o Tahiti, fiz uma obra e deixei-o original, ele havia sido pintado de branco, retornei ao verniz. Naveguei com ele até 1991 quando então comprei o Fiesta, que pertencia ao meu primo Miguel Genta, e o qual batizei de Colibri.
Não seguirei regras de diário de bordo, pois conheço muitas e muitas histórias das quais participei e que foram contadas com uma visão diferente da minha, talvez seja por causa dos meus óculos, que necessito para enxergar... não sei! Mas quando as coisas nos diários de bordo são muito “certinhas”, o meu Santo desconfia. Imaginem o cara numa tempestade escrevendo um diário de bordo ou fazendo anotações olhando o anemômetro, alguns números podem falhar. Agora se ele me contar que não soltou o leme nem pro xixi porque não dava, só tirava de canto de olho a arrebentação da onda. Tudo bem, ai é padrão! O problema todo é o aumento, não da lente dos meus óculos, mas sim das histórias contadas.
Na verdade não sei nem por onde começar, são lembranças em profusão, se abrir a porteira é capaz de sair tudo de uma vez só.
Para não atrapalhar minhas lembranças começarei pela Lagoa Mirim, após a morte de meu pai, quando comprei o Tahiti, uma semana depois que reformei ele todo, isto entre 1982 e 1983...
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